Volta ao Mundo por Pedro Guerra – Dias 22 a 27 Kilimanjaro – Kenya & Tanzânia

Pedro Guerra / Atualizado a

#Kilimanjaro

Entro no carro que aluguei para ligar o aeroporto de Kayseri à Cappadocia. Está na hora de fazer o caminho inverso. Levo os olhos fixados no retrovisor. Sinto-me prisioneiro. Sim, prisioneiro! Prisioneiro de memórias, de cenários, de cheiros, de caras, de sabores. O retrovisor reflecte o que está para trás, e é disso que estou a falar. Memórias ainda a fumegar. A fumegar com o ar quente dos balões.

Balões que sobem. Memórias que ficam. 🎈

Sento-me no avião. Cada take-off significa uma porta que se fecha. Paradoxalmente, uma porta que se abre. Obrigo-me a isso. Caso contrário ainda estava a escrever sobre a Islândia. 😍 Aterro em Istambul 1h30 depois. Escala de 3 horas e novo take-off. Reorganizo-me mentalmente. Verifico passaportes. Bilhetes. Voucher do hotel. Releio procedimentos do visa on arrival. 6h30 de voo! Novo país! Novo continente! Nova aventura… e que aventura!

Let’s go!! Primeiro destino: Kenya, Nairobi. 🇰🇪

África está no meu coração. Por razões familiares. Por razões profissionais. Esta será a volta ao mundo que incluirá mais países africanos. Quiçá 4 no total, a juntar aos 9 que já conheço. África! Um continente que te esfrega a cara no chão. Que te obriga a redefinir a matriz de prioridades.. de valores e pseudo preocupações. Um continente onde as pessoas te sorriem de verdade. Onde o pôr-do-sol é um espectáculo diário e gratuito. Onde a natureza ainda predomina sobre o betão. Onde os leões ainda caminham livremente. Primeiro estranha-se, depois entranha-se!

Aterro no aeroporto internacional de Nairobi. São 3 da manhã, hora local. Estou meio zonzo, confesso, mas ainda com discernimento suficiente para ser o primeiro a preencher toda a papelada e tratar do visa on arrival enquanto o diabo esfrega um olho. Sento-me junto ao tapete 6. Vejo a minha mala. Fico onde estou. Acompanho-a com o olhar. Aguardo pacientemente enquanto ela percorre todo o tapete, que se move ininterruptamente e rotativamente por 360 graus. Sorrio enquanto releio a frase anterior. 360 graus?! Isso é uma volta completa ao globo e esta, esta não é uma mala qualquer. “Esta é a terceira volta ao mundo que fazes”, murmuro, como se lhe estivesse a dar uma palmadinha nas costas. Retiro-a. Dou por mim a imaginar um ranking das malas que estão em cima do tapete. Qual será a mais viajada?! Aposto que a minha ganha, de caras! Concluo com algum pretensiosismo à mistura.

Malas que viajam. Memórias que carregam.

Saio do aeroporto. Vejo a placa: “Pedro Guerra”. Não há como enganar. Reservei um jipe que me vai levar até à fronteira com a Tanzânia. São 5 horas de viagem. 4 horas em alcatrão. 1 hora em terra batida. Rapidamente percebo que a minha consciência não me vai deixar adormecer. Está escuro. Muito escuro. Rectas longas seguidas de curvas apertadas. Centenas de camiões. Alguns sem luzes. Lombas não sinalizadas. Ultrapassagens várias. Carros em contra mão. Animais na estrada. Adormecer?! Hahah tá bem tá!

(Mãe, espero que tenhas pulado o último parágrafo.)

O binômio Kenya / Tanzânia é muito conhecido pelos seus Safaris. …mas há bons Safaris um pouco por toda a África, e eu até já fiz um dos melhores, o Kruger Park na África do sul. Porquê então escolher a zona fronteiriça Kenya / Tanzânia para passar 6 dias?! Se é verdade que há dezenas de Safaris em África, também é verdade que não há nenhum que tenha como cenário de fundo, a maior e mais impactante montanha de África: o Kilimanjaro!

Ainda no carro. As horas vão passando. A luz do sol começa a mostrar-se. São 7 da manhã. Levo a testa no vidro da janela. Óculos postos. Olhos semi cerrados. Pesados que doem. O sol está de frente. Vou a olhar, mas não vou a ver! Conhecem a sensação?! John, o motorista bate me no ombro com um enfatizado “my friend, look, look!”. Tiro os óculos. Arregalo os olhos. Baixo o vidro. Meto a cabeça de fora. Cabelos ao vento. Sinto o carro abrandar. Depois encostar! Abro a porta. Saio do carro. Caminho uns metros. Sinto o pó vermelho da terra africana libertar-se a cada pé no chão. Paro! Olho em frente! Olhos outrora pesados, agora leves! Kilimanjaro!

Os últimos anos reforçaram em mim uma certeza. Os momentos de maior clareza emocional acontecem quando fazes coincidir no tempo e espaço duas variáveis: solidão e natureza. 5 minutos após ter pousado as malas bastaram para perceber que tinha acertado em cheio! Quando olho em frente tenho a imensidão dos quase 6000m de altura do Kilimanjaro. Quando olho ao redor tenho a vida animal em estado puro, no Amboseli National Park.
Impossível pedir mais!!