Volta ao Mundo por Pedro Guerra – Dias 32 a 37 – Tailândia 🇹🇭 Laos 🇱🇦 Parte I

Pedro Guerra / Atualizado a

#amanhãpodesertarde

Finitude. A consciência de que há um fim. É paralisante no primeiro momento. Paradoxalmente energizante a partir daí. É castradora quando vem sem pedir licença. Paradoxalmente regeneradora a partir daí. É estupidamente subtrativa quando se auto-proclama. Paradoxalmente enriquecedora a partir daí. A finitude é a minha principal motivação. Com ela me energizo. Regenero. Enriqueço. A ela devo estas três voltas ao mundo.

Não deixes para amanhã. Sábios ditados.

África. 11 dias. 4 países. Memórias incontáveis. Time to say goodbye. Arrumo a mala. Quanto menos desfaço à chegada, menos refaço à partida. Optimizo. Mochila às costas e já no aeroporto. Descolo do Zimbábue. Aterro no Botswana. Descolo do Botswana. Aterro na Etiópia. Descolo da Etiópia. Aterro em Bangkok. 24 horas depois.

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Hello Thailand! 🇹🇭

Vou jogar limpo contigo desde o início. Sempre olhei para ti como aquela rapariga da escola de quem todos falam. Sobre quem todos têm opinião. Aquela que ostenta a coroa de miss da preparatória. Aquela que é identificada em todas as fotos das discotecas do bairro. A rainha das redes sociais. Arrogante por fora. Frágil por dentro. Demasiado vista. Demasiado exposta.

Inevitabilidade. Vir ter contigo não foi mais do que isso, uma inevitabilidade. O que é uma inevitabilidade?! É quando se vem aqui parar, só mesmo porque não havia melhor ligação aérea vinda de África.

Estereótipo dirão uns. Preconceito argumentarão outros. É para isso que eles servem, para atalhar processos de decisão e avaliação, digo eu.

Trago os olhos embaciados. Foi o primeiro esticão latitudinal desta terceira volta ao mundo. Hello jet lag! O calor asiático não ajuda. A humidade típica completa a recepção de boas-vindas. Tou tipo sonâmbulo. Literalmente! Chego ao quarto em sofrimento. Sento-me na cama. “Cedo ou luto?!” Pergunto-me, enquanto deixo cair a cabeça para trás. Quero ficar pouco tempo em Bangkok, embora o tempo suficiente para virar a cidade do avesso. O duche de água fria inicia a luta. Já que aqui estou… murmuro. Pés na estrada. 300 metros depois começa a pingar. Pingas que se multiplicam exponencialmente. Subitamente. Mais e mais.

“Ok Tailândia, já vi que não gostaste mesmo nada do meu primeiro parágrafo”.

As pessoas só valorizam a frontalidade quando é elogiosa. Nada de novo, portanto.

Regresso ao hotel para comprar um chapéu de chuva. Dão-me um vermelho. Peço outra cor. Tive que engolir em seco. Era o vermelho ou ficar todo encharcado. Regresso à estrada. Caminho por entre cheiros e sabores. Paro aqui e acolá. Petisco nas bancas de rua. Vou em passo lento, embora mais rápido do que os carros que tentam furar o trânsito do meu lado direito. As buzinas ecoam arritmicamente. As motorizadas personificam baratas tontas. Sobrevivem as mais adaptadas. A selecção natural que Darwin já explicou. Prossigo afirmativo. Deixo as avenidas principais. Troco-as pelas perpendiculares, é lá que tudo acontece. Infiltro-me pelos street markets. Observo comportamentos. Analiso abordagens, estratégias comerciais e frases gatilho. Aos olhos de quem vende tudo é comprável. Aos olhos de quem compra tudo é negociável. São centenas de metros de mesas de negociação em autênticos role plays comerciais. Aqui estou, entretido a acompanhar.

– “Boa noite ilustre visitante” – alguém me aborda lateralmente
– “Olá caríssimo…” – respondo educadamente sem abrandar o passo
– “Eu tenho os melhores fatos para homem que se fazem em Bangkok”
– “Fatos? Daqueles casaco e calça?” – pergunto retoricamente
– “Sim, de corte moderno, slim, vão assentar lhe como uma luva” – afirma convicto
– “Acredito! Um fato é exatamente tudo o que mais preciso no calor de Bangkok – respondo ironicamente
– “Aqui talvez não, mas seguramente no seu país? De onde é? Não trabalha?” – questiona para gerir a primeira objecção à compra
– “Estás a ver um esquimó? Eu neste momento preciso tanto desse fato, como um esquimó de um frigorífico num igloo” – despeço me com uma palmada nas costas

Fatos por comprar. Memórias que ficam.

Três dias que passam sobre os passos que dou. Palmilho a cidade de ponta a ponta. Intercalo longas caminhadas com os tuk-tuk. Rendo-me ao majestoso Grand Palace. Fascino-me com a silhueta do templo Wat Arun e os seus jardins cheios de bonsais. Compro fruta no tradicional floating market. Percorro as vibrantes ruas da Chinatown. Navego nos tradicionais canais do Chao Phraya River. Como escorpiões na famosa rua de Khao San Road. Sim, delicious! Comida saudável, orgânica! Finalmente pude usar todos aqueles hashtags da moda no instagram!

#healthyfood #organicfood #eatclean

Valeu Bangkok. Sem ressentimentos.

Continua.